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Trump impõe tarifas, sanciona autoridades e declara “emergência nacional” contra o Brasil

Manifestação em Brasília contra as tarifas de Trump. [Photo: José Cruz/Agência Brasil]

Na quarta-feira, o presidente Donald Trump assinou um decreto oficializando tarifas avassaladoras de 50% contra o Brasil, que passam a valer na semana que vem.

A ordem de Trump representa, em todos os sentidos, uma escalada sem precedentes da agressão imperialista dos Estados Unidos contra a América Latina. Escrita como uma declaração de guerra contra um país inimigo, a ordem convoca uma emergência nacional, classificando o governo brasileiro como uma “ameaça à segurança” dos Estados Unidos.

O documento não perde tempo com falsos pretextos para as tarifas como meios de assegurar uma suposta “justiça econômica” para os EUA, que mantém um substancial superávit comercial com a maior economia da América Latina. Elas são cruamente apresentadas como instrumentos para subjugar o poder constitucionalmente estabelecido e impor os arbítrios de Washington sobre a política interna do Brasil.

O principal desenvolvimento político usado por Trump para justificar essa intervenção é o julgamento em andamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de sua camarilha militar fascista pela tentativa de golpe de Estado que culminou na insurreição de 8 de janeiro de 2023 em Brasília.

Em uma inversão grotesca dos fatos, Trump, que trabalha obstinadamente para impor uma ditadura presidencial nos Estados Unidos, acusa o governo brasileiro de “perseguir politicamente um ex-presidente do Brasil, o que está contribuindo para o colapso deliberado do Estado de direito no Brasil para a intimidação por motivos políticos naquele país e para violações dos direitos humanos”.

O caso contra Bolsonaro e seus co-conspiradores está entrando em suas fases finais, com uma decisão do Supremo Tribunal Federal programada para antes do fim do ano.

O processo vem seguindo os procedimentos legais constitucionais e baseia-se em amplas evidências, que demonstram de forma incontestável que o ex-presidente e seus aliados tentaram sistematicamente derrubar o regime democrático brasileiro, impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores - PT), e estabelecer uma ditadura presidencial apoiada nos militares.

Mas, segundo Trump – cujos objetivos e métodos fascistas aplicados na tentativa de golpe de 6 de janeiro de 2021 no Capitólio de Washington serviram como exemplo fundamental para Bolsonaro – o julgamento é uma “caça às bruxas” que precisa “parar imediatamente”. Sua continuidade, seu decreto afirma, está “minando a capacidade do Brasil de realizar uma eleição livre e justa para a presidência em 2026”. Em outras palavras, Washington não reconhecerá o próximo governo eleito.

Falando como o Führer que aspira se tornar, Trump concluiu:

PORTANTO, EU, DONALD J. TRUMP, Presidente dos Estados Unidos da América, considero que o escopo e a gravidade das políticas, práticas e ações recentes do Governo do Brasil constituem uma ameaça incomum e extraordinária... à segurança nacional, política externa e economia dos Estados Unidos e por meio deste declaro uma emergência nacional com respeito a essa ameaça.

Explicando o sentido da elevação das tarifas, ele complementou: “Estou tomando as medidas nesta ordem apenas com o objetivo de lidar com a emergência nacional declarada nesta ordem e não para qualquer outro fim”. Esse argumento esclarece a lógica não apenas do ataque contra o Brasil, mas da guerra comercial que Washington está lançando contra o mundo inteiro.

Ao mesmo tempo, o documento anunciou uma lista de centenas de produtos que ficarão isentos das tarifas elevadas em 40% (que se somam a um aumento anterior de 10% no início do ano). Ela inclui mercadorias críticas como aeronaves civis, petróleo e outras matérias-primas estratégicas.

As isenções, celebradas como um “recuo” na mídia brasileira, só reforçam o caráter arbitrário e abertamente intervencionista do ataque imperialista.

Além das instituições brasileiras em geral, a ordem de Trump teve como alvo específico o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, que preside o julgamento de Bolsonaro e seus cúmplices na tentativa de golpe. Moraes está, além disso, à frente das iniciativas do Estado brasileiro para regulamentar a comunicação na internet e tomou uma série de decisões legais contra empresas como Twitter e Rumble recentemente.

Imediatamente após declarar sua “emergência nacional” contra o Brasil, o governo americano anunciou sanções econômicas drásticas contra Moraes, incluindo o bloqueio de bens, contas bancárias e ativos nos EUA e a proibição de sua entrada no país.

As sanções contra Moraes baseiam-se na Lei Magnitsky, utilizada no passado contra países como Rússia, Irã e Venezuela. A aplicação da Lei contra uma autoridade de alto escalão de um país historicamente aliado dos Estados Unidos é completamente inédita.

As medidas bélicas sendo tomadas contra o Brasil remetem à declaração de uma “emergência nacional” contra a Venezuela feita pelo governo Obama exatamente 10 anos atrás, em março de 2015.

Naquela ocasião, o World Socialist Web Site escreveu sobre a medida imperialista de Obama:

A ordem, à primeira vista, vira a realidade do avesso. Longe de a Venezuela representar uma ameaça aos EUA, sucessivos governos americanos intervieram repetidamente nos assuntos da Venezuela... 

Esta última ação, com sua declaração de “emergência nacional” e ameaça à “segurança nacional”, sugere que uma intervenção mais direta está sendo contemplada, incluindo por meios militares.

A avaliação do WSWS foi inteiramente confirmada, com os anos seguintes marcados pela busca ilegal e agressiva pelo imperialismo de uma mudança de regime em Caracas. A mesma lógica fundamenta a ordem de Trump contra o Brasil, que é ainda mais abrangente e beligerante.

A adoção de tal postura em relação ao Brasil—o maior país, economia e poder militar da América Latina—é uma ação profundamente imprudente e inflamatória por parte de Washington. Quaisquer que sejam os recuos, concessões ou acomodações que possam se seguir, as relações do imperialismo americano com a América Latina atingiram um novo estágio histórico irreversível.

A intervenção aberta na política brasileira vai muito além do que a mídia oficial descreve como a “agenda ideológica” de Donald Trump. Suas políticas implacáveis manifestam a crise do imperialismo americano e a busca desesperada para reverter o declínio prolongado de sua posição global através da força.

A ordem neocolonial que Washington busca estabelecer na América Latina liga-se profundamente com seus objetivos imperialista globais. Os interesses em jogo foram revelados pelo secretário de Defesa americano, Pete Hegseth, durante sua expedição de conquista ao Panamá em abril:

O governo Obama desviou o olho da bola e deixou a China simplesmente engolir toda a América do Sul e Central com sua influência econômica e cultural – fazendo acordos com governos locais para má infraestrutura, vigilância e endividamento.

O presidente Trump disse: “Não mais – estamos retomando nosso quintal”. É por isso que também estive lá para uma conferência dos países da América Central e do Sul. Vamos investir em maneiras que atendam aos interesses americanos em nosso quintal, à medida que impedimos a esfera de influência chinesa.

Bolsonaro e seus aliados fascistas, sobretudo seu filho, Eduardo Bolsonaro, apresentam-se francamente como ferramentas desses objetivos imperialistas profundamente rechaçados pela população brasileira e latino-americana. O governo do PT está “entregando o Brasil para a China” e fornecendo material para a “construção de bombas atômicas”, mentiu Bolsonaro recentemente, complementando: “Já passei para a equipe do Trump... Eles têm uma preocupação... de que o Brasil se consolide como uma nova Venezuela”.

O Grupo Socialista pela Igualdade brasileiro (GSI) se opõe inequivocamente às tarifas e a intervenção política criminosa de Washington contra o Brasil e a denunciamos como um ataque imperialista a um país historicamente oprimido. Mas a classe trabalhadora brasileira e latino-americana não pode lutar contra o imperialismo compartilhando o mesmo campo político da sua “própria” burguesia nacional.

Como o GSI afirmou recentemente em sua declaração denunciando a armadilha nacionalista sendo armada pelo governo Lula, os sindicatos e a pseudoesquerda contra os trabalhadores e jovens no Brasil:

Baseando-se na tradição revolucionária do trotskismo representada pelo CIQI, o GSI convoca a classe trabalhadora brasileira a responder à erupção do imperialismo e da guerra, à ameaça do fascismo e à crescente desigualdade social lutando ao lado de seus irmãos de classe internacionais pela revolução socialista mundial.

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