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Perspectivas

A conspiração fascista de Trump e como combatê-la: Uma estratégia socialista

Publicado originalmente em inglês em 20 de setembro de 2025

Desde o assassinato de Charlie Kirk, há uma semana, o governo Trump intensificou sua conspiração para estabelecer uma ditadura presidencial.

O presidente Donald Trump ouvindo a pergunta de um repórter no Salão Oval da Casa Branca, em 19 de setembro de 2025. [AP Photo/Alex Brandon]

A política do regime de Trump foi claramente definida pelo estrategista fascista Stephen Bannon, um dos aliados políticos mais próximos de Trump. “Se vamos para a guerra”, declarou ele, “vamos para a guerra”. O governo Trump está travando uma guerra – contra a população, contra os direitos democráticos, contra o governo constitucional.

Esta guerra está sendo conduzida dentro da estrutura da glorificação pública de Kirk. Na semana passada, a Casa Branca liderou uma campanha para proibir todas as críticas ao governo Trump. Trabalhadores, incluindo professores, funcionários de companhias aéreas e outros, foram demitidos por postagens críticas nas redes sociais sobre Kirk.

Na quarta-feira, a ABC/Disney anunciou que estava suspendendo o programa “Jimmy Kimmel Live!”, depois que o apresentador fez comentários moderados e corretos na segunda-feira sobre a exploração política do assassinato de Kirk. A medida seguiu uma ordem explícita da Casa Branca e seus agentes. O presidente da FCC (Comissão Federal de Comunicações), Brendan Carr, ameaçou as emissoras: “Podemos fazer isso da maneira fácil ou da maneira difícil”. A Nexstar e a Disney, desesperadas para proteger fusões e lucros multimilionários, correram para cumprir a ordem.

Em entrevistas na quinta-feira, Carr declarou que a suspensão de Kimmel não foi a “última gota”, exigindo uma “mudança drástica que está ocorrendo no ecossistema da mídia”. No mesmo dia, o próprio Trump declarou que os reguladores deveriam revogar as licenças das emissoras que transmitem “cobertura negativa” sobre ele.

A questão crítica agora é: o que deve ser feito para impedir esse avanço rumo à ditadura? Para responder a essa pergunta, é necessário identificar o contexto político da tentativa de Trump de derrubar a Constituição, os interesses de classe e econômicos que sustentam as ações do governo, a força social que tem o poder de defender os direitos democráticos e a estratégia política e o programa nos quais a luta contra Trump deve se basear.

Em primeiro lugar, é necessário deixar de lado todas as esperanças ilusórias de que o que está acontecendo seja algo diferente de uma tentativa de impor uma ditadura presidencial baseada nos militares, na polícia, em forças paramilitares e em gangues fascistas. O objetivo essencial da glorificação de Charlie Kirk tem sido fornecer um símbolo de mártir para galvanizar as forças mais reacionárias do país.

Como alertou o World Socialist Web Site, os admiradores de Hitler no círculo íntimo de Trump, como o vice-presidente JD Vance e o vice-chefe de gabinete da Casa Branca, Stephen Miller, estão seguindo o manual escrito pelos nazistas. Kirk é o “Horst Wessel” (nome de um soldado assassinado da tropa de assalto nazista) do regime de Trump, e o assassinato é o equivalente ao infame incêndio do Reichstag, a destruição do prédio do parlamento alemão, que foi aproveitada por Hitler para reivindicar o poder absoluto em março de 1933.

O cancelamento do programa de Jimmy Kimmel é mais uma ação baseada nas táticas do regime nazista. Qualquer forma de discurso, incluindo piadas, que fosse considerada insultuosa à honra e dignidade de Hitler era tratada como crime passível de punição drástica. A saudação “Heil Hitler” tornou-se um cumprimento obrigatório, mesmo entre amigos.

Em segundo lugar, Trump não está agindo sozinho. Por mais grotescas que sejam suas qualidades individuais, ele representa os interesses da oligarquia corporativa e financeira. Mais uma vez, as semelhanças com a Alemanha nazista são assustadoras. É um fato histórico que a ascensão de Hitler ao poder não teria sido possível sem os recursos fornecidos ao movimento nazista pelos principais capitalistas alemães. Uma vez no poder, o regime brutal de Hitler serviu aos interesses dos bancos e corporações alemães, que apoiaram sua ditadura.

Se há alguma diferença, a aliança entre Trump e a atual oligarquia financeira-corporativa é ainda mais intensa do que a que prevalecia na Alemanha nazista. Ela pode ser descrita, sem exagero, como um caso de amor. Em meio ao ataque de Trump aos direitos democráticos, ele foi homenageado na semana passada em um jantar na Casa Branca, onde um grupo de megamilionários e bilionários o elogiou. Um espetáculo ainda mais obsceno foi encenado esta semana no Castelo de Windsor, no Reino Unido. Sentado ao lado do rei Carlos III, Trump foi homenageado em um banquete de Estado por uma comitiva de oligarcas, incluindo Tim Cook, da Apple, Sam Altman, da OpenAI, Satya Nadella, da Microsoft, Ruth Porat, da Alphabet, os financistas Steve Schwarzman, da Blackstone, Jane Fraser, do Citigroup, Larry Fink, da BlackRock, e Brian Moynihan, do Bank of America.

Em terceiro lugar, por trás da reverência pública por Trump estão cálculos econômicos e políticos frios. A concentração impressionante de riqueza em um segmento infinitesimal da população não é compatível com formas democráticas de governo. Os ricos estão convencidos de que a defesa de sua riqueza e a exploração irrestrita da classe trabalhadora são incompatíveis com a democracia. A ditadura é sua forma preferida de regime político.

No entanto, as razões da oligarquia para apoiar a derrubada do que resta da democracia americana vão além de sua incontrolável sede por cada vez mais dinheiro e riqueza pessoal. A classe dominante americana está profundamente consciente e aterrorizada com a crise existencial do sistema capitalista. Ela sabe que a dívida nacional – que agora se aproxima de US$ 40 trilhões – é insustentável.

Os oligarcas estão convencidos de que é necessário um ataque enorme aos padrões de vida e até mesmo às vidas da classe trabalhadora. Todas as reformas sociais que remontam à era progressista das duas primeiras décadas do século XX, ao New Deal da década de 1930 e à Grande Sociedade da década de 1960 devem ser encerradas. Programas essenciais como a Previdência Social, o Medicare e o Medicaid devem ser simplesmente eliminados. A guerra contra a medicina – a ponto de acabar com as vacinas contra a COVID, o sarampo, a caxumba, a poliomielite, a coqueluche e outras doenças mortais – visa aumentar substancialmente a mortalidade infantil e reduzir a expectativa de vida.

A eliminação das regulamentações que têm proporcionado qualquer tipo de proteção contra ferimentos e mortes em fábricas, minas, armazéns, estaleiros e outros locais de trabalho é um dos principais objetivos.

Outro fator nos cálculos políticos das elites capitalistas é a crise geopolítica que o imperialismo americano enfrenta. A deterioração prolongada da posição econômica e estratégica global dos Estados Unidos atingiu dimensões críticas. A ascensão da China e o desenvolvimento de uma aliança de Estados que desafiam a hegemonia americana não podem ser detidos, exceto por meio da guerra. A militarização dos Estados Unidos exige gastos cada vez maiores, o que, por sua vez, intensifica a pressão para cortar gastos sociais e salários. Além disso, a preparação e a deflagração de guerras exigem a repressão violenta da oposição política interna.

Esses são os fatores objetivos que estão por trás do colapso da democracia americana. As políticas de Trump são as da classe dominante. Isso não significa ignorar as características patológicas específicas de sua personalidade e da sua camarilha do movimento MAGA, que conferem a esse regime seu caráter particularmente degenerado. Mas mesmo que Trump fosse removido repentinamente de cena, isso não deteria o impulso rumo à ditadura. A guerra contra a democracia e a classe trabalhadora continuaria.

Essa causa objetiva do colapso da democracia é comprovada pelo fato de que processos paralelos estão se manifestando em todos os principais países capitalistas. Em toda a Europa, partidos neofascistas estão ganhando força. O impulso em direção à ditadura é um fenômeno global.

Em quarto lugar, a identificação correta da origem da guerra de Trump contra a classe trabalhadora leva a conclusões políticas críticas. O ponto de partida de qualquer luta séria contra a ditadura é o rompimento com o Partido Democrata. Confiar no Partido Democrata para se opor a Trump é garantir a derrota.

Os democratas são, tal como os republicanos, um partido de Wall Street, do Pentágono e da oligarquia financeira-corporativa. O que eles temem acima de tudo não é a ascensão do fascismo, mas a eclosão de um movimento de massas vindo de baixo que ameace os alicerces do regime capitalista. Isso explica a capitulação covarde do Partido Democrata à glorificação fascista de Kirk e sua resposta ineficaz à suspensão de Jimmy Kimmel e a todos os decretos ditatoriais anteriores emitidos por Trump.

A prostração do Partido Democrata ficou exposta quando o Senado dos EUA aprovou por unanimidade uma resolução que marca o dia 14 de outubro, aniversário de Kirk, como o “Dia Nacional em Memória de Charlie Kirk”. Nenhum democrata, incluindo o senador Bernie Sanders, de Vermont, teve a coragem de se opor. Teria sido suficiente, e politicamente correto, opor-se ao assassinato por motivos de princípio, ou seja, que o assassinato de uma ou outra figura desprezível não serve absolutamente a nenhum interesse progressista, que semeia confusão entre os trabalhadores e os jovens e que favorece os reacionários.

Mas sancionar a elevação de Kirk – um homem cujo histórico de racismo, antissemitismo, oposição aos direitos civis e promoção da violência autoritária está bem documentado – como herói nacional é obsceno. No entanto, Sanders e os democratas aderiram a essa santificação.

No dia seguinte, 90 democratas, incluindo a liderança do partido, votaram com os republicanos na Câmara para aprovar uma resolução “honrando a vida e o legado de Charles Kirk”, elogiando o provocador fascista como um mártir da “liberdade” e do “discurso civil” e um “ferrenho defensor” da “vida, liberdade, governo limitado e responsabilidade individual”. 

Em quinto lugar, o desenvolvimento da luta para derrotar Trump deve basear-se na mobilização da classe trabalhadora numerosa – a força social que tem o poder, se mobilizada com base numa estratégia política correta, de derrotar Trump e tirá-lo do poder.

Os elementos-chave desta estratégia são:

1) A completa independência política e organizacional da classe trabalhadora do Partido Democrata e seus colaboradores e apologistas, ou seja, os Socialistas Democráticos da América (DSA, na sigla em inglês), Bernie Sanders, Alexandria Ocasio-Cortez e as inúmeras organizações e indivíduos da classe média que acreditam que gritar obscenidades em várias plataformas de redes sociais irá deter Trump. Esses são os métodos de liberais frustrados que esperam que sua retórica histérica leve o Partido Democrata a lutar contra Trump.

2) A construção de uma nova forma de organização que possa unificar a classe trabalhadora e mobilizar seu vasto poder industrial e econômico contra o regime de Trump. Essa nova forma de organização proposta pelo Partido Socialista pela Igualdade consiste em comitês de base. Eles devem ser criados em todas as fábricas, locais de trabalho, escolas e bairros para organizar a resistência à ditadura de Trump. Esses comitês devem se tornar centros de resistência, unindo todos os setores da classe trabalhadora (na indústria, logística, transporte, restaurantes e fast food, serviços sociais, defesa jurídica, educação, artes e cultura, entretenimento, medicina, saúde, ciências, tecnologia da informação, programação e outras profissões altamente especializadas) e jovens estudantes contra o governo fascista de Trump, a cumplicidade dos democratas e o ataque mais amplo aos direitos democráticos e aos padrões de vida. 

A construção de comitês de base é essencial para quebrar o domínio das burocracias sindicais, que funcionam como polícia industrial para as corporações e utilizam seu poder para bloquear todas as formas de resistência da classe trabalhadora. O poder deve ser transferido dos escritórios dos parasitas burocráticos para os trabalhadores nas fábricas e locais de trabalho, onde as decisões sobre todas as questões de estratégia, política e ação podem ser tomadas democraticamente pela classe trabalhadora.

Esses comitês de base, espalhados por todos os locais de trabalho, criarão novos centros de poder social coordenado nos quais se poderá basear a defesa da democracia em todo o país. A classe trabalhadora mobilizada será capaz de inspirar confiança e unificar todos os elementos agora dispersos do protesto em um movimento social massivo contra o governo odiado, liderado e controlado pela oligarquia capitalista.

3) Esse movimento, liderado pela classe trabalhadora, requer um programa que reflita com precisão as realidades socioeconômicas e corresponda aos interesses da esmagadora maioria da população. A oligarquia capitalista declarou guerra à classe trabalhadora. A resposta necessária é a declaração de guerra da classe trabalhadora ao capitalismo, que deve resultar na reorganização socialista da sociedade. Isso implica o estabelecimento da propriedade pública e do controle democrático pela classe trabalhadora das principais indústrias, bancos, serviços públicos e recursos naturais. Além disso, os níveis obscenos de riqueza concentrados nos cerca de 900 bilionários devem ser expropriados. Somente os 400 americanos mais ricos detêm uma riqueza combinada de US$ 6,6 trilhões, o que representa um crescimento de mais de US$ 1 trilhão em relação ao ano anterior. A concentração de tanto dinheiro e poder é um mal social que mata a democracia.

4) O elemento mais importante dessa estratégia — do qual depende a implementação e a realização de todos os elementos anteriores — é o internacionalismo. Nenhuma luta eficaz pode ser travada pelos trabalhadores nos Estados Unidos a menos que suas ações sejam coordenadas e alinhadas com as lutas da classe trabalhadora global. A ameaça do fascismo é um fenômeno internacional. A classe dominante capitalista de cada país tem sua própria versão de Trump e até mesmo de Hitler. Os trabalhadores americanos devem repudiar a ideologia reacionária, ultrapassada e autodestrutiva do nacionalismo, que é o mal primordial que instiga o racismo e os ódios étnicos utilizados pelo fascismo. Não é uma coincidência acidental que Trump tenha lançado sua ofensiva ditatorial desencadeando um ataque selvagem aos imigrantes. A privação de seus direitos democráticos foi apenas a primeira etapa na derrubada da Constituição. Os agentes mascarados do ICE que rondam as cidades são a vanguarda da milícia fascista que Trump planeja lançar contra todos os setores da classe trabalhadora.

Um corolário inseparável da luta pela unidade internacional dos trabalhadores americanos com seus irmãos e irmãs de classe além das fronteiras dos Estados Unidos é a oposição irreconciliável ao imperialismo, ao militarismo e à guerra dos EUA. O genocídio de Gaza perpetrado pelo regime sionista, que em grande parte foi realizado com armas fornecidas pelos Estados Unidos, revela a barbárie de que o capitalismo é capaz. O assassinato em massa de palestinos sancionado por todas as potências imperialistas é uma antecipação do que os oligarcas capitalistas estão preparados para infligir aos trabalhadores em seus “próprios” países.

Decorre dessa estratégia internacionalista que os direitos dos imigrantes devem ser defendidos contra a política criminosa e desumana de deportação. O princípio da cidadania por direito de nascimento, inscrito na Constituição, deve ser defendido sem concessões. Além disso, o trabalhador com consciência de classe rejeita a distinção insidiosa e cruel entre “nativos” e “estrangeiros”. As sanções e tarifas impostas pelo governo Trump também devem ser combatidas. A classe trabalhadora não pode defender seus empregos e interesses apoiando o nacionalismo econômico, que é totalmente reacionário em uma era de integração global da produção. A classe trabalhadora só pode promover seus interesses exigindo a derrubada das fronteiras nacionais, que não apenas estrangulam o desenvolvimento das forças produtivas, mas também conduzem a humanidade ao terrível caminho da guerra nuclear mundial.

Mesmo antes de Trump iniciar seu segundo mandato e lançar sua ofensiva ditatorial, o Partido Socialista pela Igualdade lançou um chamado para a formação da Aliança Operária Internacional dos Comitês de Base (AOI-CB). Essa iniciativa não só se justificou, como seu desenvolvimento adquiriu urgência candente.

5) A estratégia, a organização e a ação necessárias para derrotar Trump, defender os direitos democráticos e impedir o fascismo e a guerra não surgirão espontaneamente. É preciso lutar por esse programa. Mas a determinação necessária para assumir e travar essa luta é incompatível com o pessimismo e a desmoralização. Esses sentimentos levam à paralisia. Além disso, o pessimismo está invariavelmente ligado a uma avaliação superficial e falsa da realidade. Os democratas, os sindicatos e a mídia cultivam o mito de um governo todo-poderoso, enquanto insistem que nada pode ser feito. Isso é uma mentira. O que falta não é oposição em massa, mas sim uma estratégia política para orientar e organizar a luta contra o ataque de Trump aos direitos democráticos.

O Partido Socialista pela Igualdade apresenta este programa como base para a luta contra Trump e a oligarquia degenerada que ele representa. Nosso programa não é para os pessimistas, os céticos e os desmoralizados, mas para os lutadores entre os trabalhadores, estudantes, jovens, profissionais, artistas e intelectuais. Não há tempo a perder.

Convocamos todos os trabalhadores e jovens que concordam com essa perspectiva a se filiarem ao Partido Socialista pela Igualdade, mobilizarem o poder da classe trabalhadora, derrotarem a conspiração dos oligarcas e lutarem por um futuro socialista sem fascismo, genocídio e guerra.

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